domingo, 14 de abril de 2013

PLATÃO - O AMOR FILOSÓFICO (FILOSOFIA CRISTÃ)

PLATÃO - O AMOR FILOSÓFICO
AULA DE FILOSOFIA CRISTÃ

Quando hoje se menciona o nome de Platão em conversas do dia a dia, na maioria das vezes tem que ver com a expressão “amor platônico” , Entende-se por isso aquele amor no qual, em primeiro plano, não se encontra a cobiça
sensual, mas a atração espiritual, baseado no respeito à pessoa amada. Mas se alguém perguntar por que esse tipo de amor leva exatamente o nome de Platão, não é fácil responder. De fato, parece até injusto ligar o “amor platônico” a esse filósofo.

Isso porque, folheando a obra de Platão, em parte algumas se encontram sinais de um respeito particular pelas mulheres. Pelo contrário Platão afirma que as mulheres, quanto à virtude, estariam bem atrás dos homens e que,
como sexo frágil, seriam bem mais traiçoeiras e astutas do que eles. Chama-as de superficiais, fáceis de exaltar e de exasperar, inclinadas ao insulto e, acrescentam pusilânimes e supersticiosas. Platão chega a afirma que nascer
mulher seria uma maldição dos deuses. Aqueles homens que não tivessem se, controlado em vida, sendo covardes e injustos, após sua morte, como punição renasceriam mulheres.
Quem pensa assim das mulheres não pode dar muito espaço no matrimônio às emoções mais ternas da alma. De fato, Platão não considera o casamento uma
vida baseada em simpatia e disposição comuns entre dois seres humanos, mas um acordo visando à geração e à criação de filhos. Não é a simpatia que deve unir homem e mulher, mas a tarefa de produzir uma descendência o mais capaz e bem-educada possível. Por isso, é uma incumbência do estado cuidar para que os parceiros adequados se encontrem, As mulheres são destinadas aos homens como recompensa pela capacidade guerreira ou, ainda mais
radicalmente, é considerada posse comum dos homens. Assim, Platão não nos oferecer uma imagem romântica do amor entre homem e mulher.
Na Grécia daquela época, porém, há ainda outra espécie de relação amorosa na qual, mais que entre homem e mulher, os mais sutis estímulos eróticos podem encontrar seu lugar: a relação de um homem mais velho com um rapaz. Tende-se hoje, a ver esse tipo de relacionamento com olhos céticos. Para os gregos da época de Platão, no entanto, fazia parte do bom tom que uma estadista ou um comandante se interessasse por beijos adolescentes.
Algo semelhante relata Platão de Sócrates, seu admirado mestre. Ininterruptamente, este procura o trato com belos rapazes e, certa vez, admite ser apaixonado por duas coisas: pelo jovem Alcebíades, o genial menino-prodígio de Atenas de então, e pela filosofia. Outra vez em que Cármides, indiscutivelmente o mais belo dentre os moços atenienses se senta a seu lado, Sócrates confessa: “Caí em perplexidade, e desapareceu minha ousadia anterior, quando acreditava que seria fácil falar com ele.”
Mas o relacionamento de Sócrates com os adolescentes não é da espécie usual de relação amorosa. Nos relatos que Platão faz sobre isso, pode-se ver algo que significa o “amor platônico”. Isso é expresso da forma mais bela no
discurso que o jovem Alcebíades profere para Sócrates, o qual Platão reconta em seu diálogo Simpósio. Narra como os líderes intelectuais de Atenas se reúnem para festejar a vitória, em um campeonato de tragédias, que um deles
acabava de conquistar. Já haviam louvado o deus Eros em discursos e contradiscursos por um longo tempo. Aí – ébrio e apoiado nos ombros de uma flautista - Aicebíades adentra o círculo e começa a falar de Sócrates. Na atmosfera desse momento especial, revela o que habitualmente guarda em segredo. “Vós vedes que Sócrates é apaixonado pelos belos adolescentes e que anda sempre em torno deles e se deixa por eles fascinar.” Mas, em
verdade, “não lhe importa se é belo... ou rico ou se possui qualquer outro dos privilegio enaltecidos pela massa. Ele tem todos esse bens por fúteis e tem a nós mesmos por nada – isso vos garanto -; Sócrates leva sua vida cheio de
ironia e de desdém pelos homens.” Isso era o que tinha acontecido também com ele, prossegue Alcebíades: “Acreditava que ele interessasse por minha beleza juvenil e pensava que isso fosse um ganho incalculável e uma
felicidade indizível para mim; pois, se eu fizesse a vontade de Sócrates, poderia ouvir tudo o que ele sabia; julgava sabe-se lá o quê de minha beleza juvenil. Isso, portanto, pensava eu, e como antes nunca havia estado a sós
com ele sem um serviçal, dispensei certa vez o serviçal e ficamos sozinhos... Acreditava que, logo a seguir, Sócrates fosse falar comigo como uma amante fala na intimidade com o amado, e regozijava-me com isso. Mas nada disso
ocorreu. Continuou a conversa comigo como de costume e, após termos passado o dia juntos, foi-se embora. Depois disso, desafiei-o a praticar ginástica comigo, a fim de alcançar algo com isso. Ora, ele fez ginástica e lutou varias vezes comigo sem que ninguém presenciasse. Mas devo dizer que isso de nada me adiantou. Como nada conseguia de modo algum, parecia-me que tivesse de instar mais fortemente com esse homem e que não pudesse desistir
uma vez começando; tinha de saber afinal qual era o problema. Convidei-o então a cear comigo, assediando-o como um amante faz com o amado. Mas bem assim cedeu-me á vontade de pronto; após algum tempo pude enfim
convencê-lo a aceitar. Quando veio da primeira vez, quis partir após a refeição. Envergonhado, deixei-o ir. Da outra vez que cedeu à minha insistência, depois de termos ceado, entretive-me com ele ininterruptamente noite adentro.
Quando então quis partir, pretextei que já era tarde, forçando-o a ficar. Deitou-se, assim, sobre o leito ao lado do meu, sobre o qual também havia ceado, e ninguém mais dormia no aposento exceto nós dois... Quando, então, homens de Atenas!, a lâmpada foi apagada e os escravos estavam lá fora, pareceu-me que não precisava mais hesitar diante dele, podendo dizer livremente o que pensava. Toquei-lhe levemente e disse: ‘Sócrates, tu não dormes?’ ‘Não’, respondeu. ‘Sabes o que eu tenho em mente?’ ‘O que é?’, disse. Retruquei: ‘Que somente tu sejas um amante digno de mim. Mas parece-me que hesitas em me cortejar. Considero totalmente insensato não te fazer a vontade também nisso...; pois não há mais nada mais importante para mim do que me tornar o melhor possível; para isso, creio não há nenhum tutor mais competente do que tu. Se eu não fizesse a vontade de um tal homem,
envergonhar-me-ia...’ Após me ter ouvido, replicou ironicamente e bem a seu costumeiro modo: ‘Meu caro Alcebíades, tu não pareces realmente nada mau, se for verdade o que dizes sobre mim e força que eu tenho, por meio da qual pudesses tornar-me melhor. Pois, assim, verias em mim uma imensurável beleza, totalmente diferente da tua formosa figura. Se tu, porém, compreendes isso e, mesmo assim, tentas associar-te comigo e trocar beleza por beleza, não é em pouco que tencionava avantajar-me. Mas, em vez da aparência, é a verdade sobre o belo que tentas conquistar e, de fato, é ouro por cobre que pensas trocar. Mas vê bem meu caro, para que não te escapes que não há realmente nada em mim... Ouvi-lo e disse: ‘No que me toca, as coisas ficam como estão; não disse nada diferente do que eu sinto. Que tu mesmo decidas como te pareces ser melhor para ti e para mim.’ Ao que respondeu: ‘Tu o disseste bem. No futuro, vamos decidir e fazer o que a nós dois pareça melhor nisso e em tudo mais.’ Após ter dito o que disse e ouvido o que ouvi e depois de, por assim dizer, ter gasto minhas flechas, acreditei que ele estivesse magoado. Levantei-me e assim como se tivesse dormido ao lado de meu pai ou de meu irmão mais velho.
Essa história não seria digna de ser expressamente lembrada, se dissesse respeito apenas a uma idiossincrasia do homem Sócrates, Mas aquele comportamento peculiar diante do amado, aquele amor que, com plena intensidade, dirige-se ao outro e que, contudo, simultaneamente se contém aquele “amor platônico”, portanto, está intimamente relacionado ao modo de ser Sócrates como praticante da filosofia e,assim, também ao modo como
Platão, seguindo justamente o exemplo de Sócrates, concebe a essência da filosofia. Pois a filosofia, tal e como a entende Platão e como, desde então – com referencia mais ou menos explícita a ele -, é entendida casa vez mais, é
ela mesma uma modalidade de Eros, ou seja, é essencialmente amor. A experiência de Alcebíades como Sócrates mostra com clareza, antes de tudo, que o Eros filosófico não é amor sensual. A propósito, este não é simplesmente rejeitado. Mas a relação erótica constitui apenas o ponto de partida para uma outra espécie de amor: justamente para a “ascese”, na qual Platão vê a essência da filosofia. Para que essa ascese ocorra, é necessário que o amor sensual não persista em si mesmo ou que não se endureça como devassidão; o amor sensual tem de ser superado e, aliás, por aquele mais alto. O caminho do amor sensual para o filosófico vem à expressão, de modo
comovente, na descrição da ascese que Platão faz no Simpósio por intermédio de Sócrates que, por seu lado, afirma estar relatando o conhecimento secreto que teria obtido de Diotima, a vidente da Mantinea. Ela o teria instruído sobre o que é a essência verdadeira de Eros, isto é, a saudade do belo ou, mais precisamente, o anseio de criar no belo. Pois, segundo Diotima, seria isso o que de fato é permanente e eterno no homem. Pois quem almejasse o belo,
quereria possuí-lo para sempre. Por isso, ao amor pertenceria a ambição do amante pela duração, pela imortalidade. Justamente essa vontade de imortalidade, porém se realizaria nos graus da ascese do belo transitório para
o eterno arquétipo de belo em si mesmo. Todos os homens “amam o imortal. Os que são fecundos conforme o corpo volta-se para as mulheres, pondo ai seu amor em ação. Proporcionam-se assim, por meio da geração de filhos,
imortalidade, memoria e felicidade por todo o futuro. Os que são fecundos conforme a alma... – como estão as coisas com eles?... Se um deles é fecundo conforme a alma desde a juventude, como adolescente e no começo da
maturidade, e quando então deseja fertilizar e gerar, aí, acredito, vai à procura do belo, no qual pudesse criar; pois jamais quer criar no feio. Sente-se antes atraído pelos corpos belos do que pelos feios, quando está apto a fecundar; e se encontra ainda num corpo belo uma alma também bela, nobre e de boa índole, sente-se inteiramente atraído por ambos. Perante esse homem encontra logo ricos dizeres sobre a virtude e sobre o que seja um bom homem
e o que deve almeiar, e o tenta educar. Ele repousa, creio, no belo, lida com ele e cria aquilo para o que, já antes disso, se dirigia sua capacidade de geração. Ausente ou presente, pensa somente nisso e, juntamente com
aquele, educam o criado. Eles poderiam, assim, ter entre sim uma comunidade muito mais estreita do que a que teriam por meio de filhos, e uma amizade mais sólida; pois estão ligados por meio de filhos mais belos e imortais’.
Só agora, porém, Platão passa a falar do segredo propriamente filosófico de Eros. Pois faz Diotima prosseguir da seguinte maneira: “Até aí, Sócrates, talvez tu também possas ser iniciado nos mistérios do amor”. Porém, não sei se tu estás preparado para a celebração e consagração supremas, em virtude das quais tudo o mais acontece, se as procede corretamente. Agora quero-te dizer e farei todo o possível para não faltar em solicitude; tenta, porém, seguir-me, se fores capaz. Quem caminha nessa direção de modo correto te de começar na juventude a se dedicar aos belos corpos. A principio, quando corretamente conduzido, tem ele de amar um único corpo e ai gerar belos dizeres. Então tem de notar que a beleza de um corpo qualquer é irmã da beleza de um outro corpo, e que, além disso, se segue o que é belo segundo a essência, seria uma grande insensatez se não se considerasse que a beleza em todos os corpos é só uma e a mesma. Quando tiver compreendido isso, mostrar-se-á como amante de todos os belos corpos, e virá a desprezar e menosprezar a perseguição exagerada de um único. Em seguida, virá a considerar a beleza nas almas mais valorosa do que o amor. Se alguém for apreciável em sua alma, mas possuir apenas pouca beleza juvenil isso lhe bastará. Ele o amará, o aceitará e virá a gerar tais dizeres e procurar os que façam o jovem melhor. Dessa forma, será forçado a reparar na beleza que há nos modos de vida e nas leis e a ver que tudo isso está ligado entre si, de modo que o belo pertencente ao corpo seja objeto de pouco interesse para ele. Após os modos de vida ele tem de se ocupar dos conhecimentos a fim de outra vez contemplar a beleza deles. Conforme contemple a beleza em sua multiplicidade, deixará de servir a apenas uma única... Ele virá a se ocupar com o vasto mar do belo e da à luz muitos belos e grandiosos dizeres e pensamentos em abnegado amor pela sabedoria, até que, então fortalecido e tendo crescido, comtemplará aquele único conhecimento que se volta para a sabedoria como tal... Tendo atingido o objetivo nas coisas do amor, virá a contemplar algo maravilhoso e belo segundo sua natureza: justamente aquilo, Sócrates, em razão do qual também todos os esforços anteriores foram feitos.
Em primeiro Lugar, o que é perpetuo o que nem nasce nem morre, nem cresce nem decresce, depois, o que não é ora belo ora feio... Trata-se, muito mais, do que é de modo perpétuo, do que é consubstancial consigo mesmo. Todas as outras coisas belas participam dele em certo mixlo... Portanto, quando se ascende por meio do reto amor por garotos, começa-se a contemplar aquele belo e, com isso, quase se toca o objetivo. Isso significa dirigir-se corretamente às coisas do amor ou 2 clas ser conduzido por um outro, de modo que, por amor do próprio belo, comece-se a ascender em níveis, de modo continuo, a partir daqueles belos singulares. De um corpo belo a dois e de dois a todos, dos corpos belos aos belos modos de vida, dos modos de vida aos belos conhecimentos, dos conhecimentos, enfim ao conhecimento que a nada mais se refere do que ao próprio belo... Aqui, se em algum lugar, a vida é para o homem digna de ser vivida, uma vez que agora contempla o belo.
Dessa forma, portanto, toma-se claro o sentido mais profundo do “amor platônico”. Não consiste simplesmente na repressão da cobiça sensual. Em vez disso, concede-lhe a essa seus direitos limitados, mas os exalta a uma
forma mais elevada do desejo. Para além da beleza dos corpos, das almas, da condução da vida e do conhecimento, o amor platônico insta pela beleza em si mesma. O Eros, como Platão o entende consiste na aspiração pelo arquétipo do belo, do qual tudo o que é belo participa, ou seja, na aspiração pela ideia do belo. Assim se mostra que o “amor platônico” está o mais estreitamente ligado com o que entraria para a consciência do espirito ocidental como a grandiosa realização do pensamento de Platão: sua doutrina das ideias. Decerto, o caminho pelo qual Platão chega a sua doutrina das ideias não é incialmente o da ascese filosófica, mas sim a desilusão sobre a situação
política de seu tempo, sobre a decadência do Estado que se anunciava por toda a parte. Quando o jovem aristocrata encontra o artesão Sócrates e, então, põe fogo nas suas tragédias, volta-se – afetado pela questão da justiça –
apaixonadamente para a politica. Nisso tem de fazer a experiência de que no entorno dominam a injustiça e a corrupção. De modo mais caro, depara com esse estado de coisas quando tem de ver o modo como Sócrates, a quem nada mais interessa do que a virtude e a justiça são condenadas e executadas. Se o próprio homem da suprema responsabilidade tem de sucumbir com a decadência do Estado, então, conclui Platão, este mesmo deve estar em desordem desde a raiz. Não há, assim, nenhum outro remédio do que uma reflexão radical sobre os fundamentos do Estado, ou seja, sobre a essência da justiça.
Com essa certeza, Platão torna-se um filosofo. Agora, pergunta-se sobre a significação da justiça como tal e sobre o que se passa com os outros modos do reto comportamento, da coragem, da prudência, da piedade, da sabedoria.
Nessas reflexões, Platão descobre que o homem sabe desde sempre, originariamente, o que é justiça e o que são outras virtudes. Ele traz em sua alma arquétipos de todos esses retos modos do comportamento. E esses
arquétipos podem e devem determinar a sua ação.
Enquanto Platão persegue sua descoberta, uma segunda observação vem em seu auxilio: que uma ação seja justa e a outra injustiça, que, além disso, uma ação seja mais justa que a outra – isso só pode descobrir com base
em tal arquétipo da justiça. Mas essa conexão entre a realidade e ideia não diz respeito apenas ao campo da ação humana. Também o que seja uma arvore só o sabemos desde que tenhamos em nós o arquétipo da arvore. O
conhecimento da realidade total só se torna possível quando o homem possui em sua alma arquétipos de tudo o que é. Com vistas ao arquétipos do ente, o homem pode então dizer: isto é uma arvore, aquilo é um animal; isto é um
crime, aquilo é uma boa ação. Porém, isso significa ainda que todo o real é o que é enquanto participa de seu
arquétipo e enquanto aspira a tornar-se semelhante a esse seu arquétipo. A arvore quer ser tanto quando possível arvore, o homem, tanto quando possível homem, a justiça, tanto quando possível justiça. Tudo aspira a realizar na
existência sua ideia característica. Assim, Platão conquista uma imagem viva do mundo como lugar de um incessante ímpeto pela perfeição – de um Eros
pela ideia. Mas se é assim, conclui Platão, tem-se de admitir que o ente propriamente dito não seja as coisas, mas aqueles arquétipos. As coisas tornam-se o que são apenas por meio de sua participação nos arquétipos. Os arquétipos, as ideias e, portanto, de diminuto grau de realidade. O que é propriamente real no real é
a profundidade da realidade. A isso se acrescenta ainda, que ao ser das coisas pertence sua transitoriedade, ou seja, o fato de que nasçam se modifiquem e pereça. O mesmo não se pode dizer dos arquétipos. A ideia da justiça permanece sempre e que é e bem assim a ideia da arvora. Assim já expressava Diotima: Aquele
belo em si mesmo, o arquétipo da beleza, é o que “permanentemente é, o que nem vem a ser nem perece, nem cresce nem diminui”. O real originário está dessa forma livre de toda transitoriedade. A ele se destina, porem, toda a
aspiração do mundo como um teto, todo o Eros. O transitório aspira ao eterno: esse é, para Platão, o segredo da realidade.
Com Base nesse pensamento, Platão consegue lançar um olhar também sobre a essência do homem. Isso porque, agora, tem de perguntar de onde afinal se originam os arquétipos que, desde sempre, o homem tem diante dos
olhos quando reconhece o real. O homem não os criou e os desenvolveu ele mesmo. Mas também não os obteve de sua experiência durante sua existência temporal, já que antes de poder reconhecer uma ação justa como justa, uma
arvore como uma arvore. Porém levanta-se de novo a questão, de onde se origina esse saber? Platão responde: esse saber tem de ser atribuído ao homem se lembra de uma contemplação originaria desse arquétipo, a qual
precisa ter ocorrido antes de sua existência temporal. Portanto, conhecer é relembrar. Assim, a teoria da ideia conduz necessariamente, à certeza da imortalidade.
Dessa existência anterior à vida temporal, durante a qual o homem contempla as ideias, fala-nos Platão por meio de uma imagem fantástica. No dialogo Fedro, Platão narra como as almas transitam em séquito dos deuses acima da
abobada celeste e contemplam, assim, os arquétipos de todo o real. “Zeus, o grande príncipe dos céus, conduzindo seu carro atado, é o primeiro a partir; ele ordena tudo e cuida de tudo, segura uma legião de deuses e demônios”. A eles se unem também as almas humanas, em uma carruagem de dois cavalos e um cocheiro. “Transportados de carro para fora da abodada celeste, percorrem seu dorso, lá estacionados, são conduzidos pela própria rotação da aboda celeste, em cujo movimento circular, então, contempla o que há no exterior”. O espirito de cada uma das almas que queira acolher em si o que lhe é adequado, vê assim de tempos em tempos o ser seu espirito ama e contempla o verdadeiro, aproxima-se dele e desfruta-o, até que a rotação a leve novamente ao mesmo
ponto. Durante a revolução, porem, contempla a justiça mesma contempla a prudência, contempla o conhecimento... E todos os demais entes verdadeiros e deleita-se com isso. Então, as almas ingressam de novo no domínio abaixo da abobada celeste e seguem para casa. Lá chegando o cocheiro conduz os cavalos para a manjedoura, lança lhes ambrosia e, depois, mata sua sede com néctar. Dessa contemplação que lhe é proporcionada em sua preexistência, restará ao homem por toda sua vida certa nostalgia. Ele aspira retornar ao originário de onde veio. Dai surge seu empenho de libertar da prisão das cobiças sensuais e de, já nesta existência terrena, alcançar a contemplação das ideias na visão das coisas mesma.
O belo adquire então uma significação especial. Platão fala sobre isso no dialogo Fedro: Se alguém vê aqui a beleza e, assim, se lembra do verdadeiro, será dotado de asas e, uma vez alado, anseia por ascender. Mas não o
consegue. Por isso, fica olhando como um pássaro para cima e se desculpa do que está embaixo. Então lhe acusam de louco. Mas esse é o melhor de todos os entusiasmos. O entusiasmo surguria do fato de cada alma humana, originariamente, ter contemplado o verdadeiro ser. De fato, não é fácil a toda alma se relembrar disso com base nas coisas – nem aquelas que antes e apenas brevemente puderam contemplar, nem aquelas que, lendo-se precipitado, se acidentaram e, agora, se voltam em companhia duvidosa para a injustiça, esquecendo o sagrado que lá contemplaram. Somente a algumas poucas resta uma lembrança suficiente. Quando elas, porém, avistam algo
que seja semelhante ao que viram lá, ficam fora de si e não recobram mais o controle de si mesma.  O caminho do entusiasmo, pelo qual o homem, já durante sua existência terrena, pode alcançar de novo a pura contemplação do essencial, é para Platão a filosofia. Por isso, diz que não há “maior bem que, como dadiva dos deuses, coubesse ou viesse a caber aos mortais”. A filosofia é a suprema perfeição do Eros pela ideia. Arrancando o homem de sua existência cotidiana e elevando-o para os arquétipos, a filosofia iguala-se a própria loucura. Mas
Platão diz que essa espécie de loucura seria mais esplendida do que todo o prudente bom senso; pois este teria sua origem no próprio homem, enquanto a loucura do Eros pela ideia seria uma obra dos deuses. Por fim, Platão
chega a afirma que o Eros seria ele mesmo essencialmente filosofa. Porque filosofia significa amor pela sabedoria. Porém a sabedoria pertenceria às coisas mais belas. Assim, se o Eros persegue o belo, a sabedoria tem de ser seu
objetivo essencial. Por isso, o Eros é necessariamente amante da sabedoria e, portanto, filosofo. Do filosofo vale, por fim, o que Platão diz na republica: Por sua natureza ele aspira ao ser. Não pode deter-se nas muitas singularidades, das quais apenas se acredita que sejam. Contrariamente, prossegue e não se desencoraja nem abandona o Eros antes de ter apreendido a natureza daquilo que é... Quando tiver se aproximado do que verdadeiramente é e se unido a ele, criando assim razão e verdade, então terá alcançado o conhecimento. Agora vive de verdade, cresce e estará livre de suas dores.  É essa, portanto, a significação ultima do “amor platônico”. A paixão daquele que filosofa, e sem ela não haveria nenhuma procura verdadeira pelo eterno.
Assim, Roussaeau pode ter certeza quando diz que a filosofia de Platão seria a verdadeira filosofia dos amantes.

Um comentário: